segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Após 7 anos de implantação, SAMU se aproxima da universalização no Brasil

"A ausência de serviços públicos na periferia da cidade de São Paulo criou uma situação inusitada: nos bairros pobres, as ambulâncias são sinônimo do carro, na maioria das vezes velho, do vizinho do paciente. Ou seja: além de os hospitais estarem concentrados na região central da cidade, é difícil chegar até eles. A `frota informalÂ’ de ambulância da ­periferia é composta por Brasílias, Fuscas, Caravans e por outros modelos que já saíram de linha há pelo menos dez anos. Sem recursos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) e mão-de-obra especializada, os vi­zinhos motorizados são a forma mais rápida de garantir ao doente pobre acesso ao hospital".

O leitor pode confundir-se, mas é fácil perceber que a notícia não é atual. Publicada em 15 de outubro de 2000 pela Folha de São Paulo, ela descreve a situação em alguns pontos da capital paulista três anos antes de o SAMU virar um programa federal de saúde pública. Notícias semelhantes eram comuns na época em di­ferentes cidades brasileiras. No entan­to, até o final de 2011, a ausência de um servi­ço móvel de urgência não de­­ve mais ­estampar jornais em nenhuma localida­de do país. Essa é a aposta da CGUE (Coordenação Geral de Urgência e Emergência), do Ministé­rio da Saúde. No próximo ano, universalizado e re­­giona­lizado, o SAMU deve chegar a todos os bra­­­sileiros, seja por terra, pelo mar ou pelo ar.

Trata-se de uma conquista daquele que é exaltado como o maior serviço pré-hospitalar do ­mundo, atualmente. Tendo o reconhecimento da popu­la­ção pelo número 192, o SAMU chega a um mo­men­to de avaliação, no qual, apesar dos êxitos e a­­cer­tos, muito se debate sobre o seu futuro e a ne­­­cessidade de ajustes em seu caminho.

O primeiro deles é que a simples presença do ser­viço não é garantia de um atendimento rápido e eficaz. "O futuro será crescer, ou seja, estar disponível à maior parcela da população que se conse­gue hoje e com mais duas e­xigências: atuar dentro de um tempo compa­tível com um sistema de emergência e levar às vítimas os procedimentos que ela necessita", afirma Carlos Alberto Gu­gliel­mi Eid, che­fe do Departamento de Atendimento Pré-Hos­­pitalar da Abramet (Associação Brasileira de Me­dicina de Tráfego), no APH desde 1981, atuan­do também no SAMU São Paulo/SP.

Para Antonio Onimaru, membro do Conselho Con­­sultivo e Fiscal da SBAIT (Sociedade Brasilei­ra de Atendimento Integrado ao Traumatizado), médico do GRAU (Grupo de Resgate e Atendimento a Urgências de São Paulo) e diretor-médico da BRvida APH, o momento exige a implantação da Política Nacional de Atenção às Urgências nos pi­lares de­finidos. Ele cita a necessidade iminente de or­­ganização e reestruturação da rede as­sis­ten­cial com referências de baixa, média e, principalmente, alta complexidade resolutivas.

Desenhar a rede de urgência e emergência, desde a parte pré-hospitalar móvel até os hospitais, é a prioridade do Ministério da Saúde, con­­comitante com a universalização do SA­MU. "Não tem como che­­gar a 100% sem a par­ticipação de estados e mu­nicípios", salien­ta Clésio Mello de Castro, coor­de­nador-geral da CGUE, para quem o ano de 2010 foi aquele em que as unidades federativas melhor enxergaram a rede de atenção às urgências.

Na prática, entretanto, coordenadores do ser­viço reclamam que o custeio do SAMU tem se tornado muito oneroso para os municípios, já que o aporte de recursos federal estaria subdimensio­na­do e o estadual seria, em alguns casos, até inexis­tente. "O valor hoje repassado pelo Ministério, tanto para as centrais de regulação quanto para as ambu­lâncias, é muito insuficiente, piorando ainda a situa­ção quando não existe o repasse estadual", lamenta Reinaldo Del Pozzo, coordenador do SAMU Diadema/SP e coordenador municipal de Urgência e Emergência.

As dificuldades financeiras impõem restrições em investimentos, prejudicando o acesso de ­alguns serviços a equipamentos e a novas tecnologias e revelando, ainda, carências em recursos humanos. Em Belém/PA, por exemplo, o SAMU tem ­equipe de médicos reduzida e, por vezes, fica sem o profis­sional na regulação em razão da necessidade de salvar uma vida nas ruas. Segundo Afonso Rocha, coordenador do ­serviço paraense e coordenador médico do resgate aéreo do estado, apostar na valorização profissional, seja por aspectos salariais ou por educação continuada, é uma forma de manter a motivação da equipe para que se tenha um SAMU eficaz. "No APH, trabalha quem gosta do serviço, passando, muitas ve­zes, por dificuldades, porém sem nunca desistir ou abandonar um paciente", resume.


Reportagem de: Rafael Geyger
Fonte: Revista Emergência

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